ísca

Descendo uma montanha-russa inconsciente, entre portas e janelas.

Caía, lentamente, meio flutuante.

Como uma pena, por vezes em extremos.

Chegava ao chão, por fim.

Me reconhecia por inteiro e seguia o cheiro.

Em uma cozinha iluminada em amarelo, pratos postos sobre a toalha vermelha.

A sopa, ainda quente, dançava convidativamente em sinais de fumaça.

Desejava a dançante em meu ventre.

Me sentava e colherava-a.

Sentia algo que não era o gosto, mas entendia ser gostoso.

No silêncio, puxava mais sopa entre os lábios.

Nada, mas sentia algo.

Passava a língua nos dentes, uma peça solta ao céu da boca.

Cuspia uma pérola.

A tal sopa era de moluscos.

Engraçado.

Me levantava.

Trazia minha surpresa comigo.

Olhava para meus pés. Meiados.

Entendia: sopa só se come com meias.

Olhava enquanto respirava à frente das meias.

Via o suor em formato de pata.

Mínimos dedinhos.

Olhava em silêncio.

Observava a cozinha, nada à volta.

Um som, repetidamente, lá fora.

Exponencialmente alarmando o consciente.

Ciente, abria os olhos.

E no escuro me via em outros.

Amarelos, felinos.